Jamai(s)c(á)!

Jamais cá!
Julguei que assim fosse, mas enganei-me!
Jamaica! Jamaica! Desconheço donde lhe vem o nome. Desconheço se tem um significante pejorativo relacionado com a Nação da Jamaica. Não me dei, nem me darei, ao cuidado de tentar saber. Preocupo-me muito mais com a essência do fenómeno.
A essência do fenómeno vem revestida de racismo, mas infelizmente, é muito maior do que o racismo ínsito nele e que ressalta à primeira vista. As Jamaicas continuarão a existir enquanto o ser humano não mudar a sua essência, enquanto não mudar a sua natureza. Elas estarão dentro de cada um de nós até que nos convençamos que somos ricos, somos muito ricos, somos milionários, somos multimilionários, somos bilionários, somos infinitamente ricos com aquele quanto que nos basta, e que somos tanto mais pobres, quanto mais for aquele quanto que nos sobra, porque aquilo que nos sobra, estará a faltar, estará a ser retirado da boca de quem está a passar fome.
Para poder compreender o sofrimento de quem pena na Jamaica, é necessário sentir o que é caminhar pelas ruas com fome, sem um euro e sem perspectivas de o conseguir para comprar um bocado do pão que mata a dor da fome, mas que não mata a fome, porque o pão, só por si, não mata a fome.
A fome traz a revolta a quem se vê privado da riqueza que é comum, que é de todos e que é para ser dividida por todos, mas que alguns, mais lestos, mais humanamente (in)capazes, mais desavergonhados, se apropriam descaradamente, sem pinga de vergonha, sem pinga de remorsos, nem de humanidade, somente escudados pela lei do mais forte.
Estou convencido que só quando cada um de nós cumprir o "mandado de despejo aos mandarins do mundo" e a todos os outros mandarins que vivem dentro de nós (às Jamaicas que acobertamos em nós) é que as Jamaicas e todos os seus sucedâneos, incluindo o racismo, deixarão de existir, (...)"E o mundo quer a inteligência nova,// a sensibilidade nova. (...) Eu, da raça dos descobridores,// desprezo o que seja menos//que descobrir um novo mundo."
Até lá, cada um é responsável, primeiramente, pela sua própria e verdadeira revolução interior. Até que façamos essa verdadeira revolução interior, seremos espectadores pactuantes, seremos co-causadores, seremos corresponsáveis pelas Jamaicas. Os mais despertos, os mais sensíveis sentirão nojo de si próprios.
Para terminar, transcrevo um poema centenário de Álvaro de Campos (heterónimo de Fenando Pessoa(s) - digo Pessoas, tão grande ele é!), intitulado : Ultimatum.

Ultimatum
Fora tu,
reles
snobe
plebeu
E fora tu, imperialista das sucatas,
charlatão da sinceridade
e tu, da juba socialista, e tu, qualquer outro
Ultimatum a todos eles
e a todos que sejam como eles,
todos.
Monte de tijolos com pretensões a casa
inútil luxo, megalomania triunfante
e tu, Brasil, blague de Pedro Álvares Cabral
que nem te queria descobrir
Ultimatum a vós que confundis o humano com o popular,
que confundis tudo!
Vós, anarquistas deveras sinceros
socialistas a invocar a sua qualidade de trabalhadores
para quererem deixar de trabalhar.
Sim, todos vós que representais o mundo,
homens altos,
passai por baixo do meu desprezo.
Passai aristocratas de tanga de ouro,
passai frouxos.
Passai radicais do pouco!
Quem acredita neles?
Mandem tudo isso para casa
descascar batatas simbólicas
fechem-me isso tudo a chave
e deitem a chave fora.
Sufoco de ter somente isso à minha volta.
Deixem-me respirar!
Abram todas as janelas
Abram mais janelas
do que todas as janelas que há no mundo.
Nenhuma ideia grande,
nenhuma corrente política
que soe a uma ideia grão!
E o mundo quer a inteligência nova,
a sensibilidade nova.
O mundo tem sede de que se crie.
O que aí está a apodrecer a vida,
quando muito, é estrume para o futuro.
O que aí está não pode durar
porque não é nada.
Eu, da raça dos navegadores,
afirmo que não pode durar!
Eu, da raça dos descobridores,
desprezo o que seja menos
que descobrir um novo mundo.
Proclamo isso bem alto,
braços erguidos,
fitando o Atlântico
e saudando abstractamente o infinito.
Álvaro de Campos – 1917

Pensemos! Pensemos e depois..., comecemos a agir, primeiro dentro de nós... Ainda não há um único justo, um só sequer!

NB: Recomendo vivamente que assistam no youtube à declamação deste poema pela Maria Bethânia.
*Este texto foi escrito segundo os termos da ortografia anterior ao recente (des)Acordo Ortográfico.

 

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