A catástrofe ambiental nos litorais da Figueira da Foz e Aveiro

5.º molhe, na freguesia de S. Pedro (imagem de Pedro Cruz)

Como é do conhecimento público, as situações de catástrofe ambiental no litoral da Figueira da Foz - erosão feroz das dunas a sul do molhe do porto comercial, e assoreamento brutal das areias a norte desse molhe (afastando cada vez mais o mar da cidade, e pondo em risco o próprio porto, a sua economia, e as vidas de quem o utiliza) - são situações que estão a agravar-se cada vez mais, nos últimos meses, ao longo deste Inverno de 2017-2018; e por isso motivaram já uma visita recente do Ministro do Ambiente à Cova-Gala, para tal convidado pelo presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz e presidente da Junta de Freguesia de São Pedro.

Nesta conjuntura, aqui se divulga a tomada de posição, datada de ontem, dia 10, do arquitecto surfista Miguel Figueira e do surfista Eurico Gonçalves (ambos do conselho consultivo e científico do Centro de Estudos do Mar-CEMAR), em nome do movimento cívico SOS Cabedelo, em que solicitam uma nova audiência na Comissão de Ordenamento do Território da Assembleia da República Portuguesa, para aí apresentarem de novo este assunto, dado que nele não parecem ter existido quaisquer desenvolvimentos substanciais e positivos.

Não houve quaisquer desenvolvimentos desde que, em 10.03.2017, nessa mesma Assembleia da República Portuguesa, foi aprovada uma resolução através da qual se recomendou ao Governo português que tomasse medidas no âmbito da protecção da orla costeira e da segurança de pessoas e bens, que desenvolvesse com carácter de urgência acções de transposição sedimentar nas barras dos portos da Figueira da Foz e Aveiro, que os estudos de viabilidade recomendados pelo Grupo de Trabalho para o Litoral para o sistema de transposição sedimentar nessas barras da Figueira da Foz e Aveiro tivessem um prazo temporal definido (sem mais demora), e que no decorrer do ano de 2017, o mais depressa possível, fosse feito um estudo específico que avaliasse a implementação da solução técnica do "by pass" na entrada do porto da Figueira da Foz (recomendação que, depois, foi publicada no "Diário da República" em 11.04.2017).

Nada disso tendo sido feito, houve sim, pelo contrário, uma situação de simples ripagem de areias (roubando sedimentos ao mar, em frente, na duna hidráulica submersa… [!], para os trazer mais para cima, para a duna primária, para assim se fingir que se estava a "proteger" o litoral que, desta maneira, se deixou mais desprotegido do que nunca…!]), situação essa, de verdadeiro crime ambiental, no seguimento da qual logo em Maio de 2017 foi apresentada em Bruxelas uma queixa pela utilização por Portugal do dinheiro europeu para este fim.

O movimento cívico SOS Cabedelo (que o CEMAR nesta matéria apoia) insiste de novo, na Assembleia da República Portuguesa.

(Alfredo Pinheiro Marques)

(Transcrição)
“Exmo Sr Presidente da Comissão Parlamentar de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação, Deputado Pedro Soares.

Um ano após a audiência do movimento cívico SOS Cabedelo na Comissão Parlamentar do Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação (CAOTDPLH), de onde resultou a recomendação para que o Governo tomasse medidas no âmbito da proteção da orla costeira e da segurança de pessoas e bens e que desenvolvesse, com caráter de urgência, ações de transposição sedimentar nas barras da Figueira da Foz e Aveiro, o nosso desejo e a vontade expressa no voto dos deputados na Assembleia da República em 10.3.2017 continuam por cumprir.

O Governo deixou terminar 2017 e o prazo previsto na Resolução da Assembleia da República nº 64/2017 sem apresentar qualquer estudo que avaliasse a implementação do bypass na entrada do porto da Figueira da Foz ou, se o fez, não o divulgou como tinha sido recomendado. Os estudos de viabilidade recomendados pelo Grupo de Trabalho para o Litoral para o sistema de transposição sedimentar nas barras da Figueira da Foz e Aveiro, em Dezembro de 2014 e inscritos no Programa da Orla Costeira, publicado em Agosto de 2017, continuam por fazer, enquanto a praia a norte cresce, a sul diminui e na barra se agrava a segurança da navegação. As sondagens para o aprofundamento da barra prosseguem sem que o estudo da transposição de sedimentos avance, validando a tese de uma fuga-para-a-frente, sem qualquer preocupação com a viabilidade do porto a prazo. Assistimos, ainda, impotentes à perda da capacidade resiliente necessária ao bom funcionamento da barra com a saturação da baía a norte, à perda do mar na cidade e à perda da praia no sul.

Sobre a recomendação da inscrição transposição sedimentar dos valores estimados da deriva litoral, a implementação da infraestrutura para o sistema de transposição e o aproveitamento de sedimentos em fim de ciclo, nos instrumentos de planeamento, programas, planos de ação e plano anual para o litoral, pouco sabemos porque a informação é escassa. O próprio Plano de Ação Litoral XXI para 2018, amplamente noticiado, não se encontra disponível para consulta. Sabemos, no entanto, que as verbas negociadas com a Comissão Europeia para a “reposição do equilíbrio da dinâmica sedimentar”- POSEUR, estão a financiar ações que nos afastam desse objectivo na medida em que, com a extração de sedimentos da praia submersa, promovem o agravamento do deficit sedimentar. Contradição esta que continuámos a assistir em 2017 na empreitada "Reconstituição do Cordão Dunar no Cabedelo, a Norte da Praia da Leirosa e a Norte da Praia da Vagueira" e que obrigou à denúncia junto da Comissão Europeia.

O alerta sobre o agravamento do deficit sedimentar por via das ripagens de areia efectuadas na praia da Cova, oportunamente denunciadas em Maio de 2015, o destaque na reportagem do programa Biosfera, RTP2, em Fevereiro de 2016, as explicações prestadas sobre este caso em concreto na Comissão Parlamentar CAOTDPLH em Janeiro de 2017, não impediram a Agência Portuguesa do Ambiente de continuar com a extração de sedimentos na praia submersa em áreas com forte impacto erosivo. O anúncio da intervenção com carácter de urgência pelo Sr. Ministro do Ambiente em Janeiro de 2018 na praia da Cova é esclarecedor quanto ao resultado de tantos milhões de euros mal investidos.

Independentemente da necessidade de uma ação imediata na praia da Cova, importa perceber como irá esta ser feita: se vamos voltar às ripagens ou avançamos para o aproveitamento de sedimentos em fim de ciclo provenientes da praia a norte da barra. Importa também saber se a transferência anunciada de um milhão de metros cúbicos, do lado norte para o lado sul da barra da Figueira da Foz, é para repetir todos os anos, com o recuo da linha de costa a norte da barra, como é proposto na Resolução da Assembleia da República nº 64/2017, ou se serve apenas o imediato, adiando o problema. Mas sobretudo importa saber qual o novo prazo para o cumprimento das recomendações de carácter urgente que o Governo ignorou.

Hoje, um ano depois da nossa audiência na Comissão Parlamentar CAOTDPLH, não estamos na mesma; estamos muito pior. Agravou-se o equilíbrio sedimentar, com os milhares de metros cúbicos de areia que o mar arrastou, sem esforço, enquanto esperávamos pela resposta do Governo. Continuará a agravar-se a cada dia que passa.

Pelo exposto, vimos por este meio solicitar uma nova audiência à Comissão Parlamentar CAOTDPLH a que V. Excelência preside, retomando o tema do equilíbrio costeiro que, pelos piores motivos, está na ordem do dia.


Miguel Figueira e Eurico Gonçalves

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