Opinião: Os passos do sonho do Paço…

A visão tradicional das “atitudes” enquanto crenças, disposições a agir e sentimentos, transformou-se, mais recentemente, na concepção das atitudes como avaliações, que se relacionam de uma forma complexa com crenças, sentimentos e acções. É ainda importante referir que a atitude pode ser positiva ou negativa, pode exprimir acima de tudo atracção ou repulsa em dependência ao objecto, pode ao nível dimensional ser unidimensional ou multidimensional, e a sua acessibilidade poderá estar associada à força dessa mesma atitude. Importará ainda referir que de forma sintética que as atitudes auxiliam-nos a definir grupos sociais, a vincar as nossas identidades e a orientar o nosso pensamento assim como o comportamento.
O presente enquadramento, procura acima de tudo, clarificar a visão tradicional das “atitudes” no que diz respeito às concepções políticas do actual “governo” da Câmara Municipal da Figueira da Foz. Façamos um pouco de história…
Em 22 de Julho de 1999 é notícia “Um concerto ao fim de tarde com os solistas de Salsburgo, a pianista Maria José Morais e a New Dixie..” sob o título “Paço de Maiorca abre amanhã ao público”. Ao longo da notícia constatamos que “O Paço, recentemente adquirido pela Câmara Municipal” é apresentado com eloquente descrição do seu espaço, assim como da história familiar dos ilustres Viscondes, fechando a mesma com o horário ao público. Também um outro Jornal Regional, datado de 25 de Julho de 1999, enaltece o Paço de Maiorca com o título “(Es)Paço de Cultura revela-se ao público” onde a magniloquência semântica volta a descrever o espaço, incluindo os jardins. Acrescente-se que neste jornal, numa segunda caixa de notícia, é destaque a intervenção de reabilitação do Paço e espaços adjacentes, o projecto havia já sido entregue a dois distintos e cotados arquitectos, estando previsto que as obras de reabilitação decorram a partir do início do ano (2000). Em jeito de curiosidade a mesma notícia relata que o início das obras só acontecerá na data anunciada, porque o prestigiado realizador Português José Fonseca e Costa, iria ali rodar a comédia “Viúva rica, solteira não fica”.
Convirá recordar que, o referido filme foi “rodado quase em exclusivo na Casa da Ínsua, na periferia da vila de Penalva do Castelo, concelho do distrito de Viseu” e foi apresentado em 2006. Tal como vós, percebi agora, que as obras não avançaram na data prevista porque estavam à espera da rodagem do filme, que nunca aconteceu em Maiorca. A sabedoria popular, produziu ao nível cultural múltiplos ditados populares, atrevo-me a invocar um, sobejamente conhecido, de que “não há duas sem três”, assim a terceira notícia, da qual não consigo precisar a data com exactidão, tem o título fabuloso de “Paço “lidera” futuro centro cultural de Maiorca”, o que, com a maior honestidade retumbava extraordinariamente para os grandiosos e ilustres habitantes de Maiorca. No corpo da notícia da época, todos ficaram a saber, que o executivo pretendia “transformar a zona do largo do Terreiro…num centro cultural e numa sala de visitas do concelho para a recepção de diversas individualidades” e ainda que “A esta grande área juntar-se-á o edifício da GNR, prevendo-se a construção de um novo quartel”, (considero esta parte deliciosa). A meio da notícia, a cereja no topo do bolo, por via do apelo declarativo do Edil aos que no futuro ocuparem a Câmara Municipal e Assembleia Municipal “Que nunca lhes passe pela cabeça dar outra utilidade que não foi aquela pela qual o Paço foi adquirido”.
Para o leitor mais atento convirá neste momento clarificar que o presente texto é alicerçado factualmente através de método científico. Reforçando que a ciência surge como uma forma hegemónica de construção da realidade, por um lado através da sua finalidade e coerência, por outro lado pelo carácter metódico e universal com que executa o tratamento de dados, de forma a permitir a verificação e fidedignidade das informações recolhidas.
Todas estas promessas de grandeza, ficaram pelo caminho, ou analisando por outro prisma, partiram conjuntamente com o seu ideólogo mais para o sul do país, para a “Big City”.
Voltando à visão tradicional das “atitudes” enquanto crenças, disposições a agir e sentimentos, poderemos nesta fase acrescentar uma outra o mito. Este mito do “Sebastianismo” que emulsiona a esperança de que regressaria um dia, numa manhã de nevoeiro, para salvar o país de todos os seus problemas, neste caso da Figueira da Foz.
Passados praticamente 22 anos, mais precisamente a 2 de Setembro de 2021, irrompe um outro fenómeno, não é no Entroncamento, é por coincidência outra vez em Maiorca, a invocação do turismo da desgraça em plena campanha eleitoral. A verdade é que, a Câmara Municipal promoveu de forma activa este turismo da desgraça para as visitas ao Paço de Maiorca, sendo lamentável, a forma como os decisores políticos, recém empossados, divulgaram e promoveram negativamente o seu concelho através destas atitudes..
D. Sebastião regressou e ganhou, com toda a legitimidade, e com ele todas as promessas de grandezas e de soluções. Sob o ponto de vista isotérico poderia até afirmar que continua a “enfeitiçar” com as suas múltiplas e exuberantes promessas, que possuem efeitos reais dessa rede particular de comunicação humana constituída através da magia da sua semântica.
Através da maior agência de notícias de língua portuguesa, a 3 de Novembro de 2021, O Paço volta à ribalta, com a notícia “Recuperação de edifícios municipais é “prioridade” … na Figueira da Foz”, ficámos a saber, e transcrevo “Que o Paço de Maiorca vai ser recuperado não tenham dúvida nenhuma, a orientação é recuperar”. De forma muito espontânea surgiu-me um pensamento : Afinal ainda existe coerência…nesta vida.
Por enorme surpresa minha, em 2023, continuam a suceder-se fenómenos neste concelho.
Na próxima quarta-feira, 21 de Abril, está agendado o ponto à reunião de Câmara “Alienação do Paço de Maiorca - obtenção de autorização da Assembleia Municipal”. Sim, leram bem.
Esta autorização para alienação de bens imóveis de valor superior a 1.000 vezes a remuneração mensal mínima garantida, é da competência da Assembleia Municipal de acordo com a Lei.
Para esta autorização é invocado o nº 1 do artigo 3º do regulamento para alienação de bens imóveis do Município da Figueira da foz que estabelece o seguinte: “Podem ser vendidos quaisquer imóveis pertencentes ao domínio privado do Município da figueira da Foz cuja propriedade não seja necessária à prossecução de fins de interesse público e cuja manutenção da sua propriedade não seja conveniente.”
Ora após a evidência das notícias publicadas ao longo dos anos, e não falamos de protagonistas diferentes, fiquei com a percepção, de que não só existia interesse público, mas acima de tudo que a manutenção da propriedade Paço de Maiorca era conveniente. O que mudou?
O Paço de Maiorca foi adquirido em 1999 por cerca de 160.000 contos (798.076€), o que no final de 2022 pelo factor de actualização seria a preços correntes 1.262.523€. Pelo que depreendo a base de licitação para hasta pública será de cerca de 1.083.757€, menos 14,2% do que o valor de aquisição há 24 anos.
Em suma, O Paço de Maiorca ou Paço dos Viscondes de Maiorca é um Imóvel de Interesse Público de acordo com o Decreto nº 129/77, DG, 1ª série, n.º 226 de 29 setembro 1977 / ZEP, Portaria 261/2011, DR, 2ª série, n.º 20 de 28 Janeiro 2011, com o número (antigo): PT020605070014
Todo o conjunto é indissociável e representa uma forte componente histórica, cultural, arquitectónica e decorativa revelando-se de grande importância a sua preservação.
Classificado como Imóvel de Interesse Público, a lógica seria a solicitação de homologação da tutela para ser Monumento Nacional. Este processo permitiria a sua reabilitação, com uma candidatura a fundos estatais/comunitários, por via de um processo similar ao convento de Seiça.
O concelho necessita imperiosamente deste monumento ao serviço da cultura e do turismo assim como a população de Maiorca.
Pelos motivos expostos, enquanto cidadão residente no concelho da Figueira da Foz, sou contra a sua alienação.

Miguel Pereira

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