Congresso/ANMP: Finanças locais preocupam municípios desde fundação da associação

Pedro Pimpão

O então autarca de Sousel Artur Torres Pereira foi o primeiro presidente eleito, na Figueira da Foz, com preocupações de representar os interesses dos municípios junto do poder central e consolidar a autonomia do poder local, incluindo a financeira.
Pedro Pimpão, presidente da Câmara de Pombal (PSD), é o candidato único a presidente no XXVII Congresso da ANMP, que decorre no sábado e no domingo no Centro Cultural de Viana do Castelo.

O novo presidente que a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) elegerá no fim de semana terá de negociar uma nova lei de finanças locais, um tema que tem acompanhado todos os congressos desde que a associação foi fundada.
Pedro Pimpão, presidente da Câmara de Pombal (PSD), é o candidato único a presidente no XXVII Congresso da ANMP, que decorre no sábado e no domingo no Centro Cultural de Viana do Castelo, pelo que deverá ser o sexto presidente da associação, após Luísa Salgueiro (PS, de 2021 a 2025), Manuel Machado (PS, de 2013 a 2021), Fernando Ruas (PSD, de 2002 a 2013), Mário de Almeida (PS, de 1990 a 2002) e Artur Torres Pereira (PSD, de 1984 a 1990), que foi o primeiro presidente do organismo.
Nesta reunião magna de autarcas serão debatidos temas como a autonomia, a descentralização e o financiamento local, temas que têm estado presentes em todos os congressos desde o início da ANMP, numa altura em que os autarcas reivindicam uma nova lei das finanças locais, considerando que a que está em vigor é anacrónica, não permite estabilidade financeira nem previsibilidade de gestão, tendo em conta o aumento progressivo das competências transferidas para os municípios.
Há mais de 40 anos, foram, aliás, as insuficiências das finanças locais que levaram presidentes de Câmaras de todos os partidos e de todo o país a reunirem-se em Alcobaça, em 1983, para discutirem como se poderiam organizar a uma só voz contra o centralismo do Estado, dando origem, em maio de 1984, à ANMP.
O então autarca de Sousel Artur Torres Pereira foi o primeiro presidente eleito, na Figueira da Foz, com preocupações de representar os interesses dos municípios junto do poder central e consolidar a autonomia do poder local, incluindo a financeira.
Portugal tinha saído do Estado Novo há cerca de uma década e os municípios, nesse período, foram o principal motor de desenvolvimento próximo das populações, num país onde, em 1974, apenas metade das casas tinham eletricidade e água canalizada, faltavam sistemas de esgotos, escasseavam transportes, a saúde era precária e um quarto da população era analfabeta.
Com a nova Constituição de 1976, e depois das primeiras eleições autárquicas, coube aos dirigentes eleitos dos então 304 municípios (hoje são 308) assumir a responsabilidade de criar infraestruturas - pavimentar as ruas, abrir as estradas, ligar a água e os esgotos, construir as escolas e de colaborar na definição das políticas de habitação e urbanismo.
Desde o início, foi reclamado por estes autarcas mais verbas para pagar todas estas obras, uma vez que a autonomia financeira local era incipiente e tinha grande dependência central.
Em 1984 foi criado o Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF), estabelecendo a forma de transferência de verbas do Orçamento do Estado (OE) para os municípios, mas com alguma discricionariedade, o que motivou contestação.
Em 1987, no ano seguinte à adesão de Portugal à União Europeia, uma lei das finanças locais, sucessivamente afinada nos anos seguintes, consagrou a autonomia financeira das Câmaras, que passaram a ter direito a receitas próprias e capacidade de terem os seus orçamentos, apresentarem contas e gerirem o património, além de limites ao endividamento, cabendo a supervisão ao Estado.
Com Mário de Almeida, em 1998, e com Fernando Ruas, em 2005, as normas das finanças locais tiveram grandes revisões, com maior autonomia financeira, novas fontes de receita, nomeadamente através de impostos, como o IMI (imóveis) e a Derrama, maiores transferências, mas também maior controlo da despesa e mais limites ao endividamento.
Para o endividamento da generalidade dos municípios contribuíram diversos fatores, como, entre outros, as crises económicas e recessões, decisões de gestão financeira inadequada e investimentos em obras insustentáveis ou sem receitas suficientes – foram exemplo as dívidas devido à construção dos estádios do Euro 2004, que os respetivos municípios ainda pagavam muitos anos depois.
A atual lei foi aprovada em 2013, durante a intervenção da ‘troika’, endurecendo ainda mais os limites de endividamento, enquanto legislação complementar estabeleceu mecanismos de saneamento e recuperação financeira de municípios em dificuldades, como o Fundo de Apoio Municipal (FAM).
O número de municípios que excederam o limite da dívida total diminuiu drasticamente desde então e até 2023, embora tenha sido verificado um ligeiro aumento nos últimos dois anos, e as contas municipais são consideradas mais certas em estudos dos contabilistas certificados e do Tribunal de Contas.
Quanto às competências das Câmaras, até aos anos 1990 o processo de transferências foi lento e dependente de acordos interadministrativos celebrados entre o Estado e certos municípios. Em 1999 uma lei previu a transferência progressiva de competências em áreas como o ambiente e a cultura, transportes escolares, apoio a crianças e idosos, mas só no regime jurídico das autarquias locais, em 2013, foi estabelecido um modelo mais alargado e generalizado de delegação de competências aos concelhos que o desejassem, embora através de contratos.
Em 2018, no mandato de Manuel Machado, foi negociada com o Governo PS uma nova fase de descentralização de competências num processo universal e obrigatório, com um período transitório até 2021, em 21 áreas fundamentais, como educação, saúde e ação social, habitação, património, áreas protegidas, praias e portos, cultura, turismo e atendimento ao cidadão.
A aplicação prática desta lei de descentralização, após avanços e recuos, acabou por ocorrer em 2022 e 2023, já no mandato de Luísa Salgueiro, após acordos entre o Governo e a ANMP para assegurar os meios humanos e financeiros nas áreas da educação, saúde e, posteriormente, da ação social.
Em entrevista à Lusa, Luísa Salgueiro, a presidente cessante, afirmou que deixou muita coisa por fazer, mas lamentou sobretudo terminar o mandato sem um processo de descentralização mais equilibrado, essencialmente na área da saúde, e sem ver aprovada a nova lei das finanças locais, que considera uma das causas de existir uma enorme disparidade e desigualdade entre municípios.
Apesar de a necessidade de uma nova lei ter sido consensualizada com todos os últimos Governos, o grupo de trabalho que vai realizar os trabalhos para que esta seja aprovada não chegou a ser constituído, mas o ministro da Coesão Territorial, que tutela as autarquias, Castro Almeida, remeteu a discussão para 2026, com efeitos práticos em 2027.

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